Lembro-me bem de vários professores que fui tendo até terminar o liceu que me faziam decorar palavrinha por palavrinha de grande parte das matérias para, posteriormente, reproduzi-las nos testes e exames... isto se queria ter uma boa nota!!
"Ah e tal mas professor, escrevi por palavras minhas mas o significado é exactamente o mesmo daquele que vem no livro!!" De que é que valia?! Levava logo com metade da cotação da pergunta cortada!! (Metade no mínimo!!! Ai que sou tão sofrida eu... !!)
Ora bem, eu que sou uma pessoa prática e com uma grande força anímica de sacrifício (para não dizer auto-flagelo) lá passei grande parte da minha adolescência a tornar-me intima das expressões usadas pelos Srs. Exmos. Autores dos livros escolares por forma a satisfazer as exigências de um ou outro professor mente-capto que só conseguia perceber que a resposta a determinada pergunta estava correcta se fossem utilizadas as mesmíssimas palavras que vinham escarrapachadas no livro!
Passada esta fase lá vai a menina para a faculdade...
Ali chegada tive uma professora de História do Direito que colocava a turma inteira a cantar as Ordenações Afonsinas tal qual a tabuada na 2ª classe!!
Esta professora era mimosa que só ela... uma querida, mas com uma forte pancada without any doubt!!
Tudo parecia permanecer inalterado... ouvir, assimilar, reproduzir e guardar as discordâncias e comentários menos próprios em relação a certas opiniões que ia estudando só e unicamente para mim!!
Durante grande parte da faculdade foi assim muito neste ritmo!
Quando, no decorrer das aulas um professor dizia: "o Sr. Professor XPTO defende a opinião n e o Sr. Professor OTPX tem uma posição contrária, professando a opinião y e são estas as posições que vocês têm de saber!" e alguém tinha a infeliz ideia de se pôr a pensar sobre o assunto e chegar a uma conclusão diferente da n ou da y, e pior, tornar essa opinião audível aos ouvidinhos sensíveis do professor era um ai Jesus que nos acuda!! Perguntas e mais perguntas, aquele ar que revelava um misto de indignação e de horror por um reles aluno se ter atrevido a lançar uma opinião contrária à dos grandes e consagrados mestres do Direito!!
Era nestas alturas em que percebia claramente que aquela ladainha dos professores de que podíamos e devíamos ter opiniões próprias era única e exclusivamente isso, uma ladainha... que só nos metia em confusões!
O melhor mesmo para garantir uma boa notinha era saber as opiniões dos vários autores tudinhas e, de preferência, concordar com aquela que era professada pelo nosso professor regente da cadeira!
Saída da Faculdade pensei para mim: agora é que é!! Finalmente vou poder ter a opinião jurídica que quiser, por mais absurda que for, e dizê-la bem alto sem que tenha de ser penalizada por ter a minha opinião!!
Não podia ter maior ilusão!!
Chegada ao mundo do trabalho, mais concretamente ao exercício da advocacia, não só muitas vezes me inibi de ter a minha opinião, como outras tantas tive de defender com unhas e dentes uma opinião que, para além de não ser a minha, era completamente contrária aquilo que me parecia ser o correcto...
Hoje, talvez mais madura e mais realista, deixei de me preocupar tanto com isso e já não anseio tanto por poder ter a minha opinião sobre tudo e mais alguma coisa e, principalmente, fazê-la ouvir (e se for contraditória então ainda melhor que mais pica dá!!!!!)
Não... hoje em dia já percebi que é manifestamente difícil poder exteriorizar todas as minhas opiniões sobre alguns assuntos! Quer porque naquela situação não é a minha opinião que conta, mas sim a de uma outra pessoa a quem estou a representar, quer simplesmente porque nem sempre temos de ter opinião sobre tudo porque nem tudo é sobre nós!!
É bom conseguirmos distinguir bem aquilo que nos diz directamente respeito e no qual temos (não por direito mas por obrigação) uma palavra a dizer, daquilo em que não temos nem devemos estar a mandar bitaites porque não é a nossa vida, não é assunto nosso!!
Na vida pessoal, e também (até certo ponto) na profissional é essencial termos bem presente quais as situações que nos dizem respeito e, em relação a essas, opinar consciente e responsavelmente, não falar só por falar, não dizer só para dizer que dissemos!